As lesões da cartilagem do joelho são muito comuns e podem trazer incômodos relevantes. Atualmente, existem várias opções de tratamento eficaz, com ou sem cirurgia.
A cartilagem é um tecido que recobre a superfície de contato entre os ossos nas articulações. A cartilagem saudável tem características especiais que permitem o movimento da articulação sem atrito, além da absorção e dissipação do impacto e forças que ocorrem no movimento.
Cartilagem articular no joelho, recobrindo a superfície do fêmur e da tíbia. A patela (rótula) também é recoberta por cartilagem.
Os principais sintomas são:
Os sintomas tendem a ser piores durante ou após esforços. Inicialmente, podem ocorrer somente com atividades mais intensas. Porém, com a progressão da lesão pode haver dor com atividades do dia-a-dia e até mesmo em repouso.
Nos casos de lesão da cartilagem da patela, a dor tipicamente é pior em subidas ou descidas, movimentos de agachamento, levantar-se de um assento baixo.
Imagem de ressonância magnética mostrando lesão de cartilagem de espessura completa no joelho.
Vários problemas ou doenças podem levar a lesões da cartilagem
Quando as lesões da cartilagem ocorrem na patela (rótula), são denominadas condropatia patelar. Já a condromalácia é o amolecimento da cartilagem, que perde sua firmeza normal. Para saber mais sobre condropatia ou condromalácia patelar, clique aqui.
Lesão de cartilagem não é sinônimo de artrose no joelho.
Artrose (ou osteoartrite) é uma doença caracterizada pelo desgaste difuso da cartilagem, com inflamação e alteração nos outros tecidos da articulação (menisco, osso, ligamento). Portanto toda pessoa com artrose tem lesões de cartilagem.
Porém, as lesões de cartilagem também podem ser localizadas (lesões focais), com o resto do joelho preservado.
A diferenciação de artrose e lesão de cartilagem focal é muito importante, já que as opções de tratamento são diferentes.
As lesões focais da cartilagem, assim como outras lesões do joelho, podem aumentar a predisposição para artrose do joelho.
Saiba mais sobre a artrose do joelho clicando aqui.
A cartilagem tem uma baixa capacidade de regeneração própria e, portanto, normalmente não se recuperam para voltar a formar uma superfície íntegra. (Mas há tratamento eficaz, veja abaixo).
Também por conta disso, as lesões podem progredir com o tempo, principalmente se não tratadas. No estágio final dessa progressão, quando há grande desgaste da cartilagem, e dos outros tecidos da articulação é chamado de osteoartrite ou artrose (saiba mais aqui)
O diagnóstico é feito através de avaliação e exame físico cuidadosos, e confirmada através de exames complementares. O principal exame a ser avaliado é a ressonância magnética.
Radiografias também são importantes para a avaliação das alterações ósseas do alinhamento do membro.
O tratamento depende da intensidade dos sintomas, do tamanho das lesões, da intensidade das atividades praticadas e da presença de outros problemas do joelho, relacionados a ligamentos, meniscos ou alterações no alinhamento.
Para a maioria dos pacientes, a primeira linha de tratamento é não-cirúrgico, e pode envolver:
Existem medicações que podem ajudar no controle de sintomas relacionados a lesões de cartilagem, mas nenhuma promove regeneração das lesões de forma comprovada.
A principal utilidade das medicações é permitir um tratamento com reabilitação e exercícios de forma mais eficaz, por diminuir o desconforto e inflamação.
A indicação de uma cirurgia é individualizada, levando em consideração fatores do paciente, da lesão e da resposta a outros tratamentos.
São situações em que o tratamento cirúrgico pode ser considerado:
Existem muitas técnicas para tratamento de lesões de cartilagem. A opção por uma técnica depende da avaliação individual da lesão e do paciente, sempre com discussão dos prós e contras de cada uma entre o médico e o paciente.
Entre as técnicas mais utilizadas no mundo estão:
Procedimento de microfratura.
Em casos de fraturas osteocondrais ou osteocondrite dissecante, pode haver no joelho um fragmento viável de osso e cartilagem que foi arrancado do seu leito. Nessa situação, a fixação do fragmento em seu local original pode ser possível.
A lesão é limpa cuidadosamente, retirando toda cartilagem desgastada do leito.
Pequenos furos, entre 1 e 2 mm, são feitos no osso no leito da lesão. Isso estimula uma resposta de reparo local, e há formação de fibrocartilagem. A microfratura tem melhores resultados em lesões pequenas.
Também conhecido como mosaicoplastia ou OATS. Cilindros de até 10 mm de diâmetro são retirados do próprio joelho do paciente, de uma área de cartilagem que receba pouca carga. Eles são então transplantados para a área da lesão. Esta técnica tem excelentes resultados para lesões pequenas e médias, mas há limitação da quantidade de cilindros que podem ser retirados do próprio paciente.
Materiais desenvolvidos por bioengenharia são usados para recobrir a lesão, com opção mais comum sendo a membrana de colágeno.
Esses materiais são absorvíveis, e permitem o crescimento de células que estimulam a produção de nova cartilagem.
A membrana de colágeno pode ser utilizada com técnicas de estímulo biológico como microfratura, aspirado de medula óssea, cartilagem fragmentada.
É utilizada para para lesões médias e grandes.
Da mesma forma que outros órgãos e tecidos, a cartilagem pode ser transplantada de um doador falecido.
Diferente do transplante do próprio paciente (autólogo), não há limitação de tamanho e lesões grandes podem ser tratadas.
A cartilagem não estimula resposta imune de rejeição, portanto não é necessário uso de medicamentos imunossupressores.
O transplante de doador tem excelentes resultados, com a disponibilidade de tecidos sendo o principal limitante.
Procedimento de transferência osteocondral autóloga (mosaicoplastia).
Tratamento ortobiológico consiste no uso de produtos biológicos para tratamento de lesões ortopédicas. Entre os produtos mais utilizados no mundo, há o PRP (plasma rico em plaquetas), BMAC (aspirado concentrado de medula óssea), gordura micro fragmentada, e terapia celular (células tronco mesenquimais ou transplante de condrócitos).
Ortobiológicos são produtos com grande potencial no tratamento de lesões da cartilagem, mas sempre devem ser avaliados em conjunto com as demais medidas de tratamento disponíveis.
Para algumas técnicas, já existe evidência estabelecida de eficácia, já outras ainda são consideradas tratamentos experimentais. Seu uso deve sempre respeitar as normas regulatórias de cada país, alguns produtos ortobiológicos só podem ser utilizados no Brasil dentro de protocolos de pesquisa.
Sim, pessoas com lesões da cartilagem podem e devem fazer atividades físicas, que inclusive é parte importante do tratamento (veja acima).
Porém, as mesmas atividades que podem ser benéficas, podem causar sobrecarga e piora das lesões, se forem feitas com erros na execução, intensidade ou planejamento. Tudo depende da tolerância individual no momento específico do tratamento.
Primeiramente, é importante que os sintomas mais agudos da lesão estejam controlados, e o tratamento mais adequado indicado pelo médico tenha sido instituído.
Reabilitação e condicionamento físico adequado são essenciais.
A partir deste ponto, atividades que sejam bem toleradas, que não causem exacerbação dos sintomas, são estimuladas. No início do tratamento, pode ser necessário fazer apenas atividades mais leves, de baixo impacto. Porém, com a melhora progressiva dos sintomas, e a depender da tolerância do corpo e da articulação, atividades mais intensas podem ser praticadas.
Uso de membrana condrocondutiva.
A prevenção é essencial, tanto para pessoas que já apresentam lesões da cartilagem, quanto para aquelas sem lesões, mas preocupadas por fazerem atividades intensas ou por terem histórico familiar.
São as medidas mais importantes:
Referências
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